O CRIME DO CIPÓ Clerisvaldo B. Chagas, 6 de agosto de 2019 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.157 SERROTE DO CRU...

O CRIME DO CIPÓ

O CRIME DO CIPÓ
Clerisvaldo B. Chagas, 6 de agosto de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.157

SERROTE DO CRUZEIRO (FOTO: B. CHAGAS).
          Com a expansão da cidade, alguns sítios de periferia vão sendo engolidos. Uns permanecem com o nome de origem, outros ganham apelidos nessa realidade. Em Santana do Ipanema começou a urbanizar-se o sítio Cipó. Terras por trás do serrote Gonçalinho (Micro-ondas), o Cipó já teve sua tragédia que até pouco tempo era marcado por uma santa-cruz. Cipó é o nome genérico de todas as plantas e hastes finas e flexíveis que servem para atar; plantas trepadeiras que pendem das árvores; embira. Cipó vem do Tupi guarani (Ici’pó) fila-fileira. O casario que se forma por trás do atual Posto Lemos em direção ao sítio Curral do Meio fez a retirada da santa-cruz que marcava o Cipó. O episódio foi narrado pelo escritor santanense Oscar Silva no seu livro de crônicas “Fruta de Palma”.
          No início dos anos trinta, a região sertaneja sofreu anos seguidos de seca braba. Começou a haver, então, roubos de bodes, na periferia santanense. A pobreza passava fome, mas foi notado que os filhos pequenos do senhor Laurindo, ou coisa parecida, estavam sempre gordinhos. Designado para resolver os problemas de roubo, o soldado Zé Contente e um comparsa, desconfiaram de Laurindo. Prenderam-no e o acusaram de roubo de bode. Mesmo sob protestos de inocência, o cidadão foi preso, amarrado e torturado. O sádico policial Zé Contente, furou o bucho do mulato, mas só encontrou alastrado. Laurindo passava o dia pelo serrote colhendo alastrado para alimentar a filharada. Foi vítima do maníaco e uma cruz na estrada ficou conhecida como a Cruz do Cipó.
          Felizmente o episódio foi resgatado pelo escritor da época. Este assunto já foi apresentado certa vez, mas com a ameaça urbana em deglutir o sítio, retornamos ao tema para que não fique no esquecimento o pequeno ramo da História Municipal. Vale salientar que nem sempre um livro de história conta todos os fatos. Crônicas, novelas, romances, poesias e outras publicações sempre contêm em algum lugar, testemunhos complementares dos escritos oficiais. Em breve, outros sítios periféricos estarão nas mesmas condições do sítio Cipó.
          Será que irão aparecer abnegados pesquisadores?
          Deus é o Senhor dos tempos.



BARBAS, BARBEIROS E CANGAÇO Clerisvaldo B. Chagas, 4 de agosto de 2019 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.156 (FO...

BARBAS, BARBEIROS E CANGAÇO


BARBAS, BARBEIROS E CANGAÇO
Clerisvaldo B. Chagas, 4 de agosto de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.156

(FOTO: B. CHAGAS).
          E eu vou novamente para Seu Atalaia. Barbeiro às antigas, calado igual a caburé. Foge à regra da maioria animada que ouve tudo, sabe de tudo e conta tudo. Mas Seu Atalaia é homem sério e sisudo. É dá um bom-dia, cortar, pagar e se despedir sem levar fofocas para casa. Após minhas perguntas sobre suas origens, mal respondeu que era de Atalaia, cidade da Zona da Mata alagoana. Passei a chamá-lo, então, claro, com meus botões, de Seu Atalaia. Ali você vê televisão sem graça, jornal do dia e revistas velhas. Caso esteja fazendo calor, tem direito a um arzinho de quebra.
          Com novos cursos de barbeiros, a rapaziada não coloca mais na fachada do estabelecimento o nome Barbearia. É Salão ou Cabeleireiro. Em Santana do Ipanema têm alguns dessa geração: O Fela, o Joinha, o Carinhoso... São alguns deles. Nem todos concordam em trabalhar com barba: “dói o espinhaço, precisa melhor equipamento, o cabelo é mais vantajoso em três por um...”. Será o fim do barbeiro tradicional? Nem ouso indagar a Seu Atalaia. Talvez ele me respondesse apenas com um sorriso. “Mestre, corte normal, nada de babados”. “Perfeitamente”, sinto a resposta interior do Fígaro, embora não seja de Sevilla.
          Barbeiro, profissão de homem manso, mas por ela passou o Moreno – barbeiro em Santana do Ipanema – à condição de chefe de subgrupo de Lampião. Sujeito franzino, sem oportunidades na polícia, de modo contrário realizou o sonho de ser elemento de guerra. Trocou a navalha Solingen por fuzil e cartucheira. Tornou-se matador de gente.
       Como barbeiro, foi surpreendido e preso Gato Bravo, ex-cangaceiro santanense disfarçado. Ê... Essa história que todo barbeiro é manso, não tem muito fundamento. Alinhavando as ideias sob a bata negra de cliente, vejo o término do trabalho.
          Saio do salão sem as fofocas do dia, mas satisfeito com a destreza do homem e o corte costumeiro.
          Profissional gente boa, ótimo prestador de serviço.
          Aplausos aos bar beiros na pessoa do Mestre Atalaia.
          Não custa nada.                                                        

PAUSA NA ENTREGA Clerisvaldo B. Chagas,1/2 de agosto de 2019 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.155 PAUSA DA  CHU...

PAUSA NA ENTREGA


PAUSA NA ENTREGA
Clerisvaldo B. Chagas,1/2 de agosto de 2019
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.155

PAUSA DA  CHUVA EM MARIBONDO. (FOTO: B. CHAGAS).
            “Corre, Maria, bote a roupa no varal, mulher! Aproveite o Sol que o tempo não está de confiança”. De fato o tempo não estava de confiança. Após chover o mês inteiro no sertão alagoano – recordando os velhos tempos – julho entregou agosto com um breve estio para estender roupa. O menino brinca de bola, os animais selvagens desentocam, o vaqueiro aboia pelas quebradas. A luz solar reluz nas folhagens muito verdes e o gado engorda por dentro do capinzal. No alpendre da fazenda o campesino aguarda com certa ansiedade o resultado do plantio. Vibra o comércio sertanejo aguardando o circular do dinheiro na safra que se aproxima. Nos riachos que cortam a zona rural, trabalhador arregaça as calças abençoando a terra.
          As noites continuam geladas e todos os panos da casa servem de cobertor. E no dia primeiro vamos aproveitando o estio para uma rodada pela BR-316, mas nas proximidades de Maribondo, vira o tempo e as nuvens vão encorpando pelas montanhas da redondeza. Muita chuva em Maceió. Tão diferente daquela chuvarada toda do sertão, porém, moderadamente. E lá vai o rolo d’água descendo para as bandas do comércio, deixando alagadas as imediações das Casas Americanas. Imaginem a situação dos Bairros Pinheiro e Mutange com tantas previsões sinistras. E o maceioense vai enfrentando o constrangimento dos torós constantes que reflete no trânsito perigoso. Coragem em sair de casa cedo com esse tempo.
          Endoidaram os climas do mundo com tanto desmatamento e tanta poluição. Mas as próprias previsões sobre pluviosidade no semiárido brasileiro, nem sempre coincidem com a realidade. Se não endoidaram também, pelo menos dão opiniões. Tradicionalmente em Alagoas, tínhamos chuvas até os meados de agosto, sendo estes quinze dias os de frio mais intenso. Ora, algumas vezes as chuvas chegam até setembro e já alcançaram, incrivelmente, outubro, o mês que nunca chovia no sertão. Você quer saber? Climatologia já avançou muito, mas ainda continua perdendo feio para a Natureza.
          Não duvidamos mais de nada.
          Deixa chover, comadre, vamos colher algodão.