A BOCA GRANDE DA
NOITE
Clerisvaldo B. Chagas, 15 de abril de 2013.
Crônica Nº 999
MACEIÓ. Foto (Skycrapercity). |
O Sol declina nas barreiras
da lagoa. Chega a melhor hora da capital alagoana. A brisa agradável vai
soprando pelas calçadas e o cheiro forte de maresia faz a cobertura. O azul do
mar está ali, bem pertinho para adocicar a vista. Uma senhora de preto varre o
passeio do lado oposto das sombras. No pequeno bar, logo o som alto é
substituído por um violão que faz lembrar vultos da minha terra. E o calor
sufocante de Maceió vai cedendo espaço ao romantismo da tardinha, do anil do
horizonte, do balanço dos coqueiros. Raros automóveis pelas vicinais, intenso movimento
à beira mar. Passam apressados os que retornam dos balneários litorâneos do
sul. Ainda nas tarefas do sábado, impossível quase beijar àquelas águas com os
pés, espalhar as espumas, palmilhar nas areias. O dever cresce e o lazer encolhe-se
na cabeça numa frustração leve. O violão continua chorando, louvando a hora da
poesia. Por trás dos muros, das telhas avermelhadas, das altas mangueiras,
tremula a arraia de algum garoto sapeca. Desce mais o Sol e o homem do violão fala
de amor e saudade matadora.
Se não o lazer benfazejo, o
recreio merecido, o balanço desejado, pelo menos a distância dos jornais, do
acre das manchetes... Às costas para o negativo. Fico no ponto de espera, mas
espera de quê? Portão capenga, carteiro enferrujado, placa sem aviso... O
presente forçando um passado sonâmbulo. Um sobrado ali, um edifício acolá, uma
rua comprida na Maceió de hoje. Nada de crianças nas ruas, nas calçadas, nas
varandas. E o azul do atlântico escurece e chama os poetas, os marinheiros,
pescadores, suicidas, sob o quarto-crescente que ora brilhará. Passa o atleta
tentando animar a rua no trote solitário de camiseta e tênis. O céu é limpo e
ave nenhuma surge pelos arredores. A monotonia vespertina entra no cérebro como
fantasma no registro espontâneo do cotidiano triste. É chegado o momento de
partida. Entro no automóvel, bato à porta e olho em torno. Vou a desfilar entre
as primeiras luzes da avenida. Traseiras de carros mostram o vermelhão que anuncia o breu. Devaneios à parte vou sendo engolido pela BOCA GRANDE DA NOITE.
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