CABAÇAS E CABACEIROS Clerisvaldo B. Chagas, 25 de fevereiro de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.477   Foi bom...

 

CABAÇAS E CABACEIROS

Clerisvaldo B. Chagas, 25 de fevereiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.477

 









Foi bom saber que o modernismo, não conseguiu extinguir por completo o plantio e uso da cabaça, fruto do cabaceiro. Até mais da metade do século passado, os sertões nordestinos usavam com bastante espontaneidade esse fruto plantado que nasce e se estira em ramas, igualmente à melancia. Feita a limpeza interior, a cabaça é utilizada para inúmeras tarefas domésticas. São elas de todos os tamanhos. Serve para transportar água dos barreiros para casa e também utilizadas como cantil nas longas viagens sertanejas. Mantém a água sempre fria em qualquer temperatura ambiental. Quando pequena, serve para guardar pólvora para espingarda tipo “soca-tempero”. São bastante usadas como boias amarradas à cintura de quem estar aprendendo a nadar.

A cabaça foi muito utilizada em forma de cuia pelos mendigos. E ainda em forma de cuia, utensílio usado nos barreiros para apanhar água. Foi bastante útil no passado como medida no comércio de farinha. “Uma cuia, duas cuias... De farinha. No Rio Grande do Sul a cabaça é chamada de Porongo, utilizado para cuia de chá mate. A industrialização e a popularidade do plástico, tornaram mais fáceis de se obter utensílios domésticos e consequentemente o desestímulo ao plantio do cabaceiro.

Em Alagoas temos a cidade de Coité do Noia e, coité é uma cuia da cabaça. Em Santana do Ipanema, temos na zona rural o sítio Cabaceiro, provavelmente antigo produtor de cuias e cabaças. O nome cabaça também era usado no masculino, mas infelizmente a criatividade humana o associou a virgindade feminina. “Arrancar o cabaço”, linguagem chula que significa tirar a virgindade, romper o hímen.

Documentos tricentenário sobre terras no sertão alagoano, registram o “riacho dos Cabaços”, no alto Sertão, como marco de sesmaria.

Foi gratificante para o sertanejo a exibição em vídeo de uma grande safra de cabaças no estado de Goiás. Destino: cuia de chimarrão.

Não temos informações, todavia, de alguma cultura na zona rural de Santana do Ipanema, hoje.  Aliás, o tempo muda, o produto escasseia, mas o sítio Cabaceiro continua testemunhando as etapas inexoráveis da história.

SAFRA DA CABAÇAS (CRÉDITO: PINTEREST).

 

  PARQUE DE VAQUJADA/CENTRO BÍBLICO Clerisvaldo B. Chagas, 24 de fevereiro de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.476 ...

 

PARQUE DE VAQUJADA/CENTRO BÍBLICO

Clerisvaldo B. Chagas, 24 de fevereiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.476

 


No momento em que a Igreja também dá uma pausa nas suas atividades, devido a Pandemia que assola o mundo, passamos defronte ao Centro Bíblico de Santana do Ipanema, notando uma solidão de deserto nas ruas do entorno. Situado no Bairro Camoxinga, mais ou menos por trás do Estádio Arnon de Melo, o lugar, ainda sem habitações, não passava de uma pista de corrida de mourão com o nome de Parque Bela Vista pertencente ao Dr. Dalmário Nepomuceno Gaia. Alguns o chamavam de Parque de Vaquejada, onde a pega de boi na pista divertia o povo. Vendida depois, aquela área de terra passou a ser loteada e atualmente representa uma área residencial bastante concorrida. Foi ali erguido o Centro Bíblico, um lugar de estudos e ações católicas que atingiu o ápice tendo à frente os saudosos senhores José Vieira e José Nogueira, o primeiro, também fundador do Sindicato Rural.

Sob o comando do padre José Augusto, então, dirigente da Paróquia de São Cristóvão, o movimento bíblico tornou-se uma imensa força católica no município com movimentos produtivos e animados que atraíam multidões. Ali surgiram compositores que revolucionaram com novos cânticos para a Igreja. Após anos a fio de crescimento e vigor, o pároco José Augusto foi comandar outra paróquia na capital alagoana. Os líderes bíblicos citados acima, faleceram, o movimento arrefeceu e, o restante não sabemos contar de certo. Lugar bastante agradável, o Centro Bíblico físico continua de pé e como referência para a região onde se acha implantado.

A área em torno do antigo Parque de Vaquejada, foi valorizada pelas ruas planas, terrenos enxutos e pavimentação em paralelepípedos, mas a existência do Centro, deu atestado final à localidade. Formou-se na área uma pequena elite do poderoso bairro. Entretanto, apesar de bem localizada para moradias, as queixas mais comuns daquela região, é crucial. A chegada da água nas torneiras ainda é um grande problema, notadamente durante o verão.

Dizem que era mais fácil derrubar o boi na faixa, no tempo do Parque Bela Vista, de que chegar água todo dia no lugar onde o gado berrava.

Nem com as rezas poderosas do Centro Bíblico.

PARTE EXTERIOR DO EDIFÍCIO CATÓLICO (FOTO: B. CHAGAS)

  ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS Clerisvaldo B, Chagas, 23 de fevereiro de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.475 Visit...

 

ONDE JUDAS PERDEU AS BOTAS

Clerisvaldo B, Chagas, 23 de fevereiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.475


Visitando a região de Coruripe e Piaçabuçu, fomos nos deliciando com a mudança de cenário. Ficou para trás o nosso Sertão de rios secos, serrotes e mandacarus. Surgiram diante de nós o rio São Francisco, praias encantadoras e coqueirais dominando o mundo. Culinária deferente e recepção fraterna, vão aumentando o desejo de esticar o passeio por mais uma quinzena. Não gostaríamos de arranjar uma briga, tal o alto número de homens nas ruas conduzindo longos facões de arrasto. No Sertão só quem anda assim, com essa liberdade armada é o carreiro, condutor de carro de boi. Mas, no trecho em que estávamos, amigos e amigas, a sobrevivência dos nativos está diretamente ligada ao coco-da-baía. O facão é ferramenta de trabalho no alto dos coqueirais.

Ligados na paisagem, no povo e nos costumes, apreciávamos o movimento de pessoas sob os esguios coqueiros praianos, quando uma senhora passou comentando com outra sobre a carestia do lugar: “Aqui, minha ‘fia’, foi onde Judas perdeu as botas!”. “Eita, meu Deus! – pensamos – se foi ali, que o Judas perdeu as botas, imaginem, então, o que ele deve ter perdido em Santana do Ipanema, a Capital da Carestia!”. E essa carestia em Santana já era apontada desde a década de 20, tornou-se tradição e continua apavorando a dona-de-casa que procura a feira livre em busca de hortifrutigranjeiros. A falta de produção da terra, acostumada com outros cultivares, permite à morte na faca cega das senhoras santanenses que procuram fazer milagres na compra desses produtos importados de Pernambuco e Sergipe.

Infelizmente uma Central de Abastecimento anunciada pelo, então, prefeito Nenoí Pinto, não chegou a ser concretizada. Daí para cá, ninguém mais ousou retirar a pedra de cima do assunto. Além dos preços absurdos, são comentadas também a qualidade dos produtos que em muitos casos se supõe que o destino seria o lixo. A cidade e região precisam de algo semelhante a uma CEASA para derrubar os preços agressivos e a qualidade murcha das ofertas de restolhos. Não importa de onde parta a iniciativa, governamental ou privada, seria um largo passo na devolução das botas do Judas, das roupas e das pragas dessa tradição abusiva que engole o consumidor santanense. 

Xô! Xô! Xô! Ideias cansadas, obsoletas, medievais. Não queremos vender graxa para as botas do Judas!

FEIRA LIVRE NA CHUVA DE SANTANA (FOTO: B. CHAGAS/ARQUIVO).