TEMPO DO ADEUS (Clerisvaldo B. Chagas. 13.5.2010) Não sou torcedor fanático de time nenhum. Quando joga a seleção brasileira, contudo, aumen...

TEMPO DO ADEUS

TEMPO DO ADEUS
(Clerisvaldo B. Chagas. 13.5.2010)
Não sou torcedor fanático de time nenhum. Quando joga a seleção brasileira, contudo, aumenta sim o meu espírito de brasilidade. E mesmo não sendo daqueles que acompanham cotidianamente o futebol, não tenho como fugir das notícias da bola que alentam milhões de seguidores. Não lembro há quantos anos ouvi um comentarista famoso da televisão falando sobre as promessas do esporte. Entre outros comentários, dizia ele que estava despontando um menino pobre, muito bom no drible e na personalidade. Dizia ainda o profissional, que o garoto chutava com os dois pés, o que era uma raridade em nossos estádios. Encerrou esse assunto advertindo que todos ficassem de olho que esse menino iria longe. Estava referindo-se a Ronaldo. Dessa vez não mostrou a sua imagem e eu ainda não o conhecia. Depois o Ronaldo foi subindo e se tornou o xodó do Brasil. No auge da sua fama em terras brasileiras, foi embora para o estrangeiro chegando à posição de melhor jogador do mundo. O apresentador da televisão estava certíssimo. Fora quase um profeta com seus olhos e conhecimentos abalizados. Ganhando o apelido de “Fenômeno”, Ronaldo passou a ser querido também pela sua personalidade dentro e fora de campo. Como um garoto pobre e morador de favela podia possuir um comportamento, maduro, sincero e equilibrado? O “Fenômeno” deixa de ser somente o xodó do Brasil e passa a ser o xodó do Planeta.
Rico, poderoso, seguindo a natureza humana, o jogador vai aqui, acolá, ao encontro de escândalos. Enfrenta oito cirurgias, engorda, tomba na fama e vai enfrentando os reveses muita vezes sem sucesso. Dos estádios europeus, palco de lutas desfavoráveis, foge para o seu refúgio brasileiro. Mas a mídia está em todos os lugares. Ao invés de dá um basta na sua carreira, prefere a vontade de jogar e o engano bondoso da melhora. O peso não mais lhe abandona. E o “Fenômeno”, o santo brasileiro dos estádios, sai de campo vaiado por milhares de torcedores cariocas. Respeito mais nenhum. Com grande dificuldade Ronaldo vai à Imprensa. Cabeça erguida, mas com uma aura de tristeza infinita que deixa o torcedor com pena. É o seu martírio pela via - Dolorosa. Mesmo assim ainda lhe resta um pouco de esperança, quem sabe, milagres acontecem. Mas a convocação para a copa acaba de erguer uma coroa de espinhos e colocar sobre a sua cabeça.
O Rei Pelé, vez em quando fala suas asneiras, mas tem razão quando aconselha a alguns deixarem os campos futebolísticos no momento certo. Eles, todavia, ignoram os conselhos e preferem continuar a guerra sem munição. Ao contrário de um pensamento pessimista, estamos, infelizmente, falando do mundo real. Como brasileiro, fiquei morto de vergonha com as vaias para aquele que nos deu tantas e tantas alegrias. Como pessoa, senti toda tristeza e frustração do “Fenômeno” em suas melancólicas entrevistas. O destino também joga como time de futebol. Como enfrentou inúmeras e duríssimas batalhas, Ronaldo precisa entender também o TEMPO DO ADEUS.

A BARONESA (Clerisvaldo B. Chagas. 28.06.2009) A cidade de Santana do Ipanema, no Sertão de Alagoas, é ladeirosa e repleta de patamares. ...

A BARONESA

A BARONESA

(Clerisvaldo B. Chagas. 28.06.2009)

A cidade de Santana do Ipanema, no Sertão de Alagoas, é ladeirosa e repleta de patamares. Tendo iniciado a sua existência em um desses patamares, logo o casario começou também a percorrer declives e aclives das cercanias. Em torno do seu sítio urbano destacam-se alguns montes denominados regionalmente “serrotes” que quer dizer, pequenas serras. Ao norte da urbe, com vista panorâmica, localiza-se o serrote do Pelado que passou a chamar-se Alto da Fé a partir do governo Genival Tenório. Ao sul está o serrote do Gonçalinho, denominado em tempos modernos, do Cristo ou das Micro-ondas; o morro da Goiabeira, também chamado serrote do Cruzeiro; o serrote Pintado e a serra Aguda. Todas essas elevações funcionam como extraordinários mirantes da cidade.
Na área rural surgem alguns montes que consolidam a palavra serrote como o serrote dos França, dos Brás, do Amparo, Severiano, dos Bois e o dos Angicos. Entretanto, o forte das elevações está no Maciço de Santana, que representa o final do Planalto da Borborema. Os destaques do Maciço — ao norte e nordeste da sede — são denominados serras como a do Poço, Camonga, Macacos, Gugi, Jardim, Mulungu e Caracol. Em eras mais distantes, essas elevações de terras férteis e micro clima ameno, abasteciam as feiras semanais da região com frutas e legumes. A serra do Poço já foi sondada como possível abastecedora de água para Santana. Vítima de uma nuvem pesada que lhe tirou boa fatia de terra, também já forneceu fósseis para os curiosos. A serra do Caracol foi marco inicial do Município. A serra do Gugi foi motivo de crônica do escritor Oscar Silva. A serra da Camonga tem histórias e lendas e, no momento é a que mais nos interessa.
A serra da Camonga forma um meio arco vindo do norte, estende seu lombo extraordinário em direção ao sul, e se debruça abruptamente sobre a estrada Santana—povoado São Félix. Esse final abrupto da Camonga é formado por imenso rochedo vertical, desnudo e branco. Quem olha de cima sente arrepios só em pensar que dali do alto caiu um vaqueiro em busca de reses desgarradas. Para os crédulos, é ali onde existe um reino encantado com sua fortuna em pedras preciosas.
Quem contempla de longe a serra da Camonga, sendo amante da natureza, fica encantado com a verticalidade do final. Sem dúvida alguma, parece uma baronesa com seu mais belo vestido rendado, sentada confortavelmente no seu trono de marfim. Aquela imagem surrealista da baronesa representa um descomunal monumento à comunhão Deus-homem, no desenho do elevado. Nem a imagem de uma rainha desbanca a figura da baronesa no seu trono cravejado de diamantes. Falta apenas um cetro. Um cetro e nada mais para que ela possa comandar terras e homens que lhes tocam os pés. serra da CAMONGA, A BARONESA DO SERTÃO



DISCUSSÃO DANADA (Clerisvaldo B. Chagas. 11.5.2010) Aqui na capital a vida também passa como no interior. Bem ali, ali mesmo no cruzamento ...

DISCUSSÃO DANADA

DISCUSSÃO DANADA
(Clerisvaldo B. Chagas. 11.5.2010)
Aqui na capital a vida também passa como no interior. Bem ali, ali mesmo no cruzamento com semáforos, um senhor pede esmola de modo diferente. Passa o dia inteiro no ponto, inclusive aos sábados, domingos. Cada fechada de sinal representa uma rodada para o homem de boné. Tudo é bem calculado: dias, horas, minutos, segundos. A presença do sinal vermelho é a ação imediata do pedinte que vai batendo devagar nos vidros dos automóveis e estendendo a mão. Como é muito calculista ele sabe quantos por cento das pessoas atendem aos seus apelos. Quem são os caridosos, homens ou mulheres? Novos ou velhos? Pretos ou brancos? O mendigo que se traja como qualquer pessoa comum sabe. Ele já passou dos sessenta, mas é durinho como um de cinquenta. O dia passa. Pela tardinha, vamos a uma farmácia no Bairro do Farol. Por coincidência, entra no estabelecimento o homem do boné. A senhorita do balcão vai atendê-lo com prioridade. E o mendigo do cruzamento despeja as moedas coletadas sobre o balcão de vidro. Arregaça os bolsos da frente. Desloca a bacia e enfia os dedos nos bolsos de trás. Enquanto os dedos caçam os cobres nos fundos do tecido, a moça vai perguntando se ainda tem. Os montinhos vão sendo separados pelos respectivos valores. Quase ao término da contagem a senhorita anuncia o montante de setenta reais. O homem ainda se torce todo em busca de outras moedas que lhes fogem aos dedos.
Analisando a contabilidade, setenta reais ao dia, durante o mês mais de dois mil reais. Pois o homem do boné fatura mais de dois mil reais por mês, no cruzamento dos semáforos. Questão de paciência e persistência. Compare agora com a grande maioria de empregados que batalha pelo salário mínimo.
Lá em Santana do Ipanema (minha terra) quando alguns homens se reuniam na porta maior da loja de tecidos de meu pai, de tudo saía. Lembro do poderoso e discreto comerciante José Acióli, quando mendigos apareciam. Balançava o dedo negativamente e dizia que pedisse ao governo. Para isso pagava seus impostos. O pedinte não entendia esse negócio de impostos, mas entendia o dedão trabalhando como palhetas de pára-brisa. Mas Acióli aconselhava aos seus que não negassem uma esmola às sextas-feiras. Já o comerciante-fazendeiro Izaías Rego, conhecido também pelo gênio forte e explosivo, despachava o mendigo com um pequeno esporro. Afirmava que só quem merecia esmolas eram cegos e aleijados.
Muitas religiões recomendam à esmola. Modernamente alguns padres não querem esse ato entre os que pedem nos templos. Querem sim, que o dinheiro dos fiéis procure os depósitos das próprias igrejas. Entre a religiosidade, o coração e as normas sociais, não está fácil de enquadrar o pensamento caritativo. Como o aborto, a discriminação racial, o uso da camisinha, o ato de dá esmola também se tornou polêmico. Isso dá uma DISCUSSÃO DANADA!