PERDIDOS NA CAATINGA Clerisvaldo B. Chagas, 5 de maio de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.526 Estávamos perdidos ...

 

PERDIDOS NA CAATINGA

Clerisvaldo B. Chagas, 5 de maio de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.526




Estávamos perdidos na caatinga. Alto Sertão de São José da Tapera, região do sítio Cacimba Cercada. O jipe amarelão passou de funcionar, o anoitecer chegava rápido e, para complicar as coisas uma bela chuvarada começou a cair. O que fazer? Nós, os três pesquisadores do IBGE, ficamos dentro do veículo enquanto a chuva caía e o tempo ia escurecendo. Como a água do céu não parava, resolvemos apelar para o veículo com chuva e tudo.  Aguaceiro no lombo, saímos empurrando o danado que pegou logo adiante. Muita alegria. Mas por onde seguir? Não sabíamos, apenas seguimos a sugestão do ditado sertanejo: “vamos no giro da venta”. E saímos rodando na vegetação mais aberta. Os embornais estavam praticamente vazios de víveres.

O amarelão continuou roncando pela caatinga guiado ora por Antônio Amâncio, ora por Antônio Moisés. A minha parte de aprendiz eu só queria exercê-la nas longas estradas empoeiradas da Tapera. Sempre no giro da venta, já passava mais de meia hora das Ave Marias quando nos deparamos com uma iluminação a candeeiro numa casa de tijolos, alta, simples e sem reboco. “Estávamos salvos”, pensamos. Na porta alta de três robustos degraus, um homem agradável, galego, parecia nos esperar. Naquela hora, qualquer som na caatinga é ouvido à distância... Estacionamos no terreiro, desligamos a chave do bicho e nos dirigimos ao galego que aguardava bem tranquilo no alto dos batentes. Todos nós conhecíamos os costumes matutos. Cumprimentamos normalmente, nos identificamos, falamos da nossa missão, amplamente divulgada pelos meios de comunicações e reconhecemos que estávamos perdidos.

O galego nos recebeu muito bem, mandou preparar um ribacão para nós (era apenas o que havia para comer) e indicou um riacho com bastante água, a uns cem metros da residência. Havia parado de chover e fomos tirar o enfado em um magnífico banho de riacho. Vestimos roupas limpas e secas e retornamos à casa do homem que tinha a profissão de carreiro. A fome estava grande, “entramos” no ribacão como quem dormira amarrado. O ribacão é uma comida grosseira feita com feijão, arroz, alguns ingredientes, sem carne. Comemos que só um bispo! Barrigas cheias, dormimos no chão, mas abrigados da frieza, da chuva e dos perigos da noite.

Ô meu Sertão, meu Sertãozinho! Orgulho em ser sertanejo nordestino!

RIBACÃO (Institucional > Receita Interna)

 

 

 

 

 

 

 

 

 

    LENDA NO SERTÃO Clerisvaldo B. Chagas, 4 de maio de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.525   Enquanto a pol...

 

 

LENDA NO SERTÃO

Clerisvaldo B. Chagas, 4 de maio de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.525


 

Enquanto a polícia faz a Operação Curupira, lembramos da Caipora sertaneja. É isso mesmo, Caipora e não Caapora, cantada e recantada por roceiros de todo o nosso país, principalmente pelos caçadores. A lenda da Caipora é sempre ligada à do Curupira, ambas com vasta literatura no Brasil. Os mais velhos sempre afirmaram que a caipora existe, sendo um ser encantado que tem como missão proteger os animais selvagens que habitam as matas. Sua aparência aos olhos humanos, depende da imaginação regional, mas a essência é sempre a mesma em todos os lugares: Caipora é um espírito protetor dos animais da floresta. No Sertão, suas ações são contadas em rodas de pessoas que ficam de queixo caído, quando narradas por caçadores que viveram a experiência inusitada.

Ao entrar na mata sem permissão, o caçador vê seus cães latindo, correndo e gritando apavorados pelo mato: caim, caim, caim... Estão sendo surrados impiedosamente pela Caipora. O caçador trata logo de se retirar. Outras vezes o invasor não consegue localizar uma caça sequer, parecendo que todos os animais estão rigorosamente escondidos. Acontece também de o caçador presenciar coisas estranhas e não conseguir matar nenhum animal além de uma cota mínima. Nunca ouvimos relatos que alguém tenha visto de frente a Caipora para descrever a sua aparência, todavia, sua presença é muita sentida na pele.

Mas, como qualquer mortal, os encantados também gostam de um agrado, segundo fala a tradição sertaneja. O caçador experiente adentra à mata levando fumo de rolo no bornal. Chega a uma árvore boa de entrega, daquelas que se bifurcam no tronco, faz a sua oferenda a Caipora e pede licença para caçar. Às vezes também leva sal. Mas, mesmo assim ainda existe a dúvida se a Caipora aceita ou não a oferenda e se consente sua caçada. O caçador sabe se ela aceitou ou não.

Histórias de Caiporas sempre estiveram presentes no vale do Rio Ipanema e nas caatingas de relevo plano da nossa terra.

Como não sentir orgulho em ser nordestino!

  CAIPORAS E CÃES (Crédito: pt.wikipédia.org)

  RUA DA PRAIA, SUA TRAJETÓRIA Clerisvaldo B. Chagas, 3 de maio de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.524   Parec...

 

RUA DA PRAIA, SUA TRAJETÓRIA

Clerisvaldo B. Chagas, 3 de maio de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.524


 

Parece estranho uma rua do Sertão com nome Rua da Praia. Mas ela existe sim, na cidade de Santana do Ipanema. Vamos aos primórdios. Com a grande cheia do rio Ipanema, em 1941, e outras menores, formou-se à sua margem direita, defronte a famosa Pedra do Sapo, um banco de areia grossa com as dimensões de um campo de futebol. Era ali ao lado da passagem molhada, cuja estrada leva a Olho d’Água das Flores. Anos e anos a fio, não nascia sequer um pé de mato, devido a salinidade.  Com o tempo algum esperto resolveu cercar o areal com fios de arame farpado. Muito tempo depois esse terreno pertencente ao leito do rio Ipanema, teve como dono o, então, senhor conhecido como Otávio Marchante, considerado torcedor número 1 do Ipanema futebol Clube.

O cidadão apontado como Seu Euclides, morava numa casinha entre o areal do rio e um longo túnel de aveloz que se iniciava no prédio da antiga Perfuratriz (já falamos sobre ela) e seguia até o primeiro beco que descia da Rua São Pedro, chamado Beco de Seu Ermírio. Pois bem, Seu Euclides comprou o areal, plantou algumas fruteiras que vingaram e cresceram. Seu Euclides, então, resolveu construir várias casinhas ao longo do antigo túnel ou para doar ou para alugar à pobreza, procedeu como o Senhor José Quirino na rua que passou a se chamar Prof. Enéas, mas ainda hoje conhecida como Rua de Zé Quirino. Pois bem, a ruazinha foi sendo povoada e crescendo com suas casas infinitamente pequenas. O próprio Seu Euclides batizou sua obra como Rua da Praia. A denominação continua até o presente momento.

Com o tempo, formou-se ali uma associação com sede de primeiro andar, igreja dedicada a N.S. de Fátima e até um campinho de futebol sofisticado, construído por um dos filhos do Seu Euclides, Luiz Euclides. O campo, vizinho ao antigo areal, ficou em lugar baixo também no leito do rio. As cheias normais o atingem.  O certo é que as últimas cheias do rio Ipanema, inundou a Rua da Praia, assim como outras que estavam no leito do rio ou no seu limiar. Grande foi o estrago. Dizem que grande parte da rua já não é mais habitada. Porém, o objetivo hoje, foi esclarecer o histórico da denominação acima.

Praia: borda marinha.

Rua da Praia (Santana): rua margem do rio Ipanema. Praia fluvial.

Ipanema enraivecido é bicho bruto.

RUA DA PRAIA E IMEDIAÇÕES APÓS A CHEIA DE MARÇO (CRÉDITO: MALTANET)