INVERNO Clerisvaldo B. Chagas, 21 de junho de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.558   Finalmente chegou o invern...

 

INVERNO

Clerisvaldo B. Chagas, 21 de junho de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.558

 

Finalmente chegou o inverno para a nossa região. Após um outono rico intercalando sol e chuva, a estação das águas encorpadas anuncia boas esperanças para o sertanejo. Mesmo em tempo de pandemia, o povo vai engrossando as feiras e, os produtos ainda frescos vindos do campo, fazem sucesso na cidade. Não deixamos, porém, de destacar o milho, muito procurado neste mês de junho e que não deve faltar nem na tapera do pobre nem na mansão do rico. O milho é uma unanimidade nordestina e o seu gosto se derrama por humanos e animais. Isso nos faz lembrar a saudosa “irmã” holandesa Letícia (Colégio Sagrada Família) bebendo café sem açúcar e dizendo que na Holanda o milho é somente para ração animal. E ela mesmo comprovava as delícias eleboradas com o produto.

O mato verde, os matizes da tela da Natura, o cheiro gostoso do mato, a chuva cortando devagar à noite inteira e o orvalho estilizado das manhãs são bênçãos divinais que grudam na alma sertaneja. À noite, a frieza aperta pelos lugares de altitude, o camponês cerra às portas logo cedo e fica a escutar tomando seu café quente, os ruídos das aves que povoam às trevas, o soprar do vento gelado nas árvores da redondeza. O cachorro dorme encolhido, o gato procura à beira do fogão, a cabocla sertaneja esquenta a cama e o dono da casa procura o calor abençoado da costela. No aproximar do arrebol, o galo pula para a estaca mais grossa, estica o pescoço e abre a garganta anunciando a dia. O cheiroso cuscuz fumega à mesa e o aroma do café coado desperta os arredores.

Ontem à noite, último dia de outono, foi dia chuvoso e devagar, porém, ao anoitecer, o tempo lembrou-se de caprichar na entrega da próxima estação. Um pé-d’água daqueles gigantes fez rios nas biqueiras, nos telhados, nas sarjetas das ruas de Santana do Ipanema, no Médio Sertão Alagoano. Provavelmente o benefício divino deve ter atingidos o geral da região. Lá dentro das 20.30 horas, a faca enorme do tempo cortou a chuva de vez e um silêncio molhado invadiu o mundo. “Preste atenção, compadre, que o tempo não está de confiança”.  E olhe que ainda faltam a roqueira de São João e o olear da chave titã de São Pedro, o porteiro do céu.

Um cafezinho vai bem, não é, minha amiga.

Fartura no Sertão e Deus nos comando.

 

  HISTOREANDO Clerisvaldo B. Chagas, 18 de junho de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.557 Foi o prefeito Hélio Roc...

 

HISTOREANDO

Clerisvaldo B. Chagas, 18 de junho de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.557


Foi o prefeito Hélio Rocha Cabral de Vasconcelos, gestão 1966-99, que, entre outras coisas importantes, construiu uma pracinha na entrada da cidade para quem vinha de Maceió. Na época, era ali na vizinhança da atual Caixa Econômica o final ou o início do Bairro Monumento. O prefeito fez erguer o logradouro elevado com acesso em degraus, ajardinou o local com motivos da flora da caatinga, colocou um mapa triangular de granito em pedestal onde estava escrito as Coordenadas Geográficas de Santana do Ipanema. A praça era pequena, mas bem feita e aconchegante e que recebeu o título de PRAÇA DAS COORDENADAS. Vizinho à praça, havia o Posto Esso de gasolina, parece que na época, único da cidade, pertencente ao senhor Everaldo Noya que chegou a vereador na urbe.

Foi nessa Praça das Coordenadas onde o, então, prefeito Adeildo Nepomuceno Marques mandou erguer em uma das suas gestões, a estátua em homenagem ao jumento e ao botador d’água. A referida estátua foi encomendada ao escultor Lisboa da cidade de Pão de Açúcar. Constava de jumento, cabresto, cangalha e as quatro ancoretas tradicionais. O botador d’água, calça arregaçada, conduzia à mão um cipó de tanger o jumento. A polêmica sobre a estátua dividiu a cidade e recebeu oposição ferrenha do vereador Everaldo Noya. O monumento ao jegue chegou às páginas da maior revista do Brasil, “O Cruzeiro”, pela reportagem do jornalista santanense Tobias Granja e também foi polêmica no Brasil. Vale salientar que a praça foi demolida quase no final do século XX e o jegue transferido para pedestal defronte à Rodoviária, onde hoje se encontra.

O local da citada pracinha, atualmente é somente um redondo de chão batido que facilita o trânsito em vários sentidos na entrada da Avenida Arsênio Moreira. O monumento ao jegue tem recebido a metade do mundo em turistas nas festas de Santana. Quanto à Praça das Coordenadas, pesquisadores ainda não sabem onde foi parar o pequeno mapa de granito de Alagoas, com as coordenadas de Santana do Ipanema. Pelo menos, em nossa última visita ao Museu Darras Noya ela ali não se encontrava.

Quem tem àquelas páginas da revista O Cruzeiro, tem um bom acervo da história do jegue santanense. Quanto às praças, são esses logradouros públicos que ajudam a democratizar o espaço. Castro Alves já dizia: “A praça é do povo como o céu é do condor”.

PRAÇA DA COORDENADAS JÁ NOS SEUS EXTERTORES. (FOTO: LIVRO 230/DOMÍNIO PÚBLICO).

  OS BOIS E OS CARROS Clerisvaldo B. Chagas, 17 de junho de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.556   No início da s...

 

OS BOIS E OS CARROS

Clerisvaldo B. Chagas, 17 de junho de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.556

 

No início da segunda metade do século XX, já havia bastante caminhões, camionetas e automóveis no Sertão das Alagoas. Inclusive o automóvel táxi, chamado na época de “carro de praça” ou “carro de aluguel”. O condutor tinha o nome de “motorista de praça” ou chofer de praça. Gostava de usar boné. E o povo, que nada deixa passar, dizia: “cabra de boné ou é corno ou chofer!”. Os mais antigos motoristas de praça que conhecemos foi o senhor Mestre Abel Mecânico e seus filhos, além dos senhores conhecidos como Zé V8 e Dota (Leopoldo). Mesmo assim, os carreiros do Sertão continuavam ainda muito fortes na atividade com os carros de boi. A convivência entre o motor e o animal, nunca foi obstáculo. Em Santana do Ipanema, os carros de boi vindos da zona rural, tinham como final de linha o poço do Juá, no rio Ipanema quando seco ou com pouca água.

O carro de boi trazia a produção do campo como o milho, feijão, algodão, queijos, suínos, galináceos e muito mais, descarregava no Juá, alimentava os bovinos com ração de palma forrageira conduzida no próprio carro, enquanto despachava a mercadoria e aguardava os produtos da feira e dos armazéns para levá-los ao campo. Alguns carreiros, arriscavam a entrada na feira aos sábados para apanhar mercadorias pesadas como tonéis e latas de querosene, arame farpado, ferramentas, móveis, tecidos, pequenos animais e produção das fabriquetas da cidade. Em tempos de cheias, a espera acontecia na margem direita do rio e os canoeiros do Juá se encarregavam do vai e vem do comércio sobre as águas.

Na gestão municipal 1961-1964, o prefeito Ulisses Silva arrancou o calçamento bruto do tempo de vila e o substituiu por paralelepípedos, pedras quadriculadas e pequenas. Isso no quadro comercial da cidade. Os carreiros foram proibidos de circularem com seus carros de rodas com aros de ferro, no centro de Santana. Logo alguns carreiros passaram a usar rodas de pneus à semelhança das carroças que assim já procediam.  O golpe foi tão grande que a maioria dos carros de boi, desapareceram da cidade e Santana deixou de ser a “Terra dos carros de boi”. Nem aos sábados se encontra esse veículo de madeira em Santana, nem mesmo para uma simples foto. Entretanto, eles continuam  vivos na zona rural e surgem às centenas e milhares na procissão da padroeira e em vários desfiles em cidades circunvizinhas como Inhapi, Olivença, Poço das Trincheiras e São José da Tapera, inclusive com carros de carneiros, bodes e jumentos.

Sertão é Sertão!

ESTACIONAMENTO DE CARRO DE BOI NO POÇO DO JUÁ, RIO IPANEMA. (FOTO: LIVRO SANTANA DO IPANEMA CONTA SUA HISTÓRIA).