CARNE DE
SOL
Clerisvaldo
B. Chagas, 18/19 de outubro de 2021
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.597
A
faca enorme e afiada cortava carene como se fosse manteiga. Salão com dois ou
três cochos grandes, era cenário da salgadeira do senhor conhecido como Otávio
Magro. As mantas de carne repousavam nos cochos dentro da salmoura. Algumas
peças ficavam penduradas na parede em ganchos de ferro como amostras daquela
delícia. Foi a única salgadeira de fabricar carne de sol, em Santana do Ipanema
que eu conheci. Ficava a salgadeira na Rua Antônio Tavares, esquina do beco que
fazia ligação com a rua de baixo, Rua de Zé Quirino, hoje prof. Enéas. Era ali,
defronte a casa do sargento Leôncio, do outro lado da via que se comprava carne
de sol. O povo jogava lixo por trás da
salgadeira e que descia até a rua de baixo, malgrado à fábrica de carne de sol,
de um lado, e uma fábrica de vinagre do outro.
Neste momento em que me
delicio com um naco de carne de sol, carne preta, como diz o meu netinho Davi,
fã dessa iguaria, à semelhança do bisavô Manezinho Chagas. A pedido do meu pai,
anos 60, lá ia eu até à salgadeira do senhor Otávio comprar carne que era
enrolada à mão e embrulhada em papel comum. Em casa a carne iria para o varal,
secar ao Sol, enquanto eu a vigiava com um cabo de vassoura contra ataques de
possíveis urubus. Hoje não existe mais o beco. Foi transformado em residência,
embora tenha sido formada uma rua de ligação entre ambas, bem vizinho. Após o
fechamento da salgadeira, não conheci até hoje nova fabriqueta em nossa cidade.
Marchantes e comerciantes
alegam muito trabalho e demora na venda pelo alto custo do produto bem feito.
Ensinam, porém, a você fazer sua própria carne de sol, sem levar ao Sol e
usando geladeira. É fácil e fica muito gostosa, mas não é a original fabricada
pelos nossos antepassados. Mais uma relíquia sertaneja que poderia gerar
emprego e exportar o produto como acontece no Pernambuco, em São Caetano. Você
poderá encontrar a carne de sol num restaurante à Rua Delmiro Gouveia,
deliciosa, mas não espere que seja na fórmula original com o Sol sertanejo.
Assim vamos matando a vontade com o produto feito em casa com quem aprendeu com
o famoso marchante e fazendeiro, saudoso Eufrásio Militão.
Na verdade, era muito melhor
quando carne de sol se escrevia com hífen. Você até pode chamar de carne de
geladeira.
Sertão em festa!
PRATO DE CARNE DE SOL (IMAGEM
DE AUTOR NÃO IDENTIFICADO).
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