ÁGUA
DO POTE
Clerisvaldo
B. Chagas, 10 de março de 2022
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 2.67
“Puxa!
Seus cabelos como estão bonitos, mulher! O que você usou?”. “Água do pote, comadre”. Quantas e quantas
vezes ouvimos esses fraseados no Sertão! Será que as águas de cacimbas do rio
Ipanema, tinha mesmo esse poder mágico de embelezar os cabelos? Que as caboclas
sertanejas tinham lá seus truques, tinham. Óleo disso, óleo daquilo, deixavam
os cabelos brilhantes para a estreia da festa de Senhora Santana. Mutamba,
babosa... Mas como a água salobra das cacimbas poderiam realizar esse desejo?
Seria a cacimba de lugares específicos? O enigma estaria na armazenagem da
água? É até bom que a gente não saiba tudo sobre as mulheres e seus segredos. Quanto
mais misteriosas, mais atraentes elas ficam.
Mas
como falamos em armazenagem d’água, ainda hoje quebramos a cabeça com cisterna,
tonel de plástico rígido, caixa de banheiro e outros babados. Sem água encanada
em Santana do Ipanema e em todas as cidades sertanejas, usávamos a armazenagem
em recipiente de barro. Para o uso do cotidiano, era o pote, a jarra e o purrão.
O pote, mais leve, arredondado, tanto servia para o transporte da água, quanto
para a armazenagem. As mulheres mais humildes usavam uma rodilha e pote à
cabeça em procura do rio. A jarra era comprida e pesada. Ficava em local da
cozinha, escorada à parede com pedras ou tijolos soltos ajudando o equilíbrio.
Depois vinha o “purrão”, uma jarra muito maior que complementava na cozinha das
residências mais abastadas, o trio famoso de barro que fazia feliz a dona de
casa.
Todas
as três peças de argila, tinham obrigatoriamente um pano na boca para servir de
coador. Depois, outro pano definitivo para cobrir jarra, pote, purrão, contra
poeira, insetos e rãs. Depois de algum tempo a água ficava fria e gostosa.
Pessoas que gostavam de beber, na falta de geladeira colocava a cerveja no pé
do pote ou dentro do recipiente. “Quem não tem cão, caça com gato”, diz o povo.
É só lembrar a música de Luiz Gonzaga, onde ele pede cerveja fria do pé do
pote, no forró. O Sertão não tem condições de pagar tantos favores prestado
pelos seus exímios artesãos, do barro, da palha, do couro e de um sem fim de
material que serviu e encantou gerações. Ainda hoje o filtro de barro
brasileiro é considerado o melhor do mundo. Não falta um filtro de barro de
marca São João em nossa casa.
Zero
água de geladeira. E seus cabelos como estão?
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