A MORTE DAS ESTAÇÕES Clerisvaldo B. Chagas, 25 de novembro de 2016 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.597 Estação Ferr...

A MORTE DAS ESTAÇÕES


A MORTE DAS ESTAÇÕES
Clerisvaldo B. Chagas, 25 de novembro de 2016
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.597
Estação Ferroviária de Lagoa da Canoa em 2014. (Divulgação).
     Morreu a esperança de quem partia, secaram as lágrimas de quem ficava. Desapareceu o romantismo ingênuo. Sumiu o longínquo apito do trem. As afirmações da laranja doce, o grito da tapioca quentinha fugiram com a fumaça do cavalo de ferro.
     A via férrea alagoana que tanto ajudou no progresso estadual teve início muito cedo e saiu marcando o norte e o vale do Paraíba do Meio. Levando e trazendo mercadorias, marcando territórios na vida das pujantes lavouras em terras férteis, descobria montes, fundava estações. De palmo em palmo, de cidade em cidade, a linha parecia representar um porvir de glórias e riquezas nas terras dos marechais. E a conquista dura chegava a Viçosa, Paulo Jacinto, Quebrangulo e finalmente descia o Planalto do Cristalino para degustar a pinha doce da Princesa Palmeira.
     Enquanto a Sertão ansioso aguardava também o abraço do trem, o cavalo virava-se para o sul ganhando os tabuleiros rebaixados do Agreste, correndo cabeça abaixo rumo ao rio São Francisco. Resfolegante da longa viagem iniciada em Maceió, chega o trem às margens do Velho Chico apitando forte em Porto Real do Colégio.
     E as pesquisas geográficas levantam-se aqui e choram ali diante do quadro atual das antigas, simpáticas, idílicas e fraternas cúmplices estações ferroviárias. Suspensas às viagens, ferrugens nas linhas, abandono nos prédios, refúgio de almas penadas. Poucas estações foram vistas com bons olhos pelas autoridades. Algumas, recuperadas e descaracterizadas transformaram-se em museus, bibliotecas... Residências. Outras, tangidas pela ignorância, o desprezo e a falta de coração, deixaram cair o teto, crescer o mato, abrigar formigas, cupins e fantasmas. 
    O destino das nossas antigas estações ferroviárias, é semelhante ao destino das também nossas lagoas interiores cansadas de uma luta inglória contra a tendência aniquiladora do bicho homem. Pesquisador sério nos estados nordestinos não anda somente com máquina fotográfica e caderno de anotações. Mas também com lenço quilométrico, igual ao do pescoço de Lampião, pois a qualquer momento pode se deparar com cenários exigentes de fontes lacrimais. 
       
     



A MORTE DAS ESTAÇÕES Clerisvaldo B. Chagas, 25 de novembro de 2016 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.597 Estação Ferr...

A MORTE DAS ESTAÇÕES


A MORTE DAS ESTAÇÕES
Clerisvaldo B. Chagas, 25 de novembro de 2016
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.597
Estação Ferroviária de Lagoa da Canoa em 2014. (Divulgação).
     Morreu a esperança de quem partia, secaram as lágrimas de quem ficava. Desapareceu o romantismo ingênuo. Sumiu o longínquo apito do trem. As afirmações da laranja doce, o grito da tapioca quentinha fugiram com a fumaça do cavalo de ferro.
     A via férrea alagoana que tanto ajudou no progresso estadual teve início muito cedo e saiu marcando o norte e o vale do Paraíba do Meio. Levando e trazendo mercadorias, marcando territórios na vida das pujantes lavouras em terras férteis, descobria montes, fundava estações. De palmo em palmo, de cidade em cidade, a linha parecia representar um porvir de glórias e riquezas nas terras dos marechais. E a conquista dura chegava a Viçosa, Paulo Jacinto, Quebrangulo e finalmente descia o Planalto do Cristalino para degustar a pinha doce da Princesa Palmeira.
     Enquanto a Sertão ansioso aguardava também o abraço do trem, o cavalo virava-se para o sul ganhando os tabuleiros rebaixados do Agreste, correndo cabeça abaixo rumo ao rio São Francisco. Resfolegante da longa viagem iniciada em Maceió, chega o trem às margens do Velho Chico apitando forte em Porto Real do Colégio.
     E as pesquisas geográficas levantam-se aqui e choram ali diante do quadro atual das antigas, simpáticas, idílicas e fraternas cúmplices estações ferroviárias. Suspensas às viagens, ferrugens nas linhas, abandono nos prédios, refúgio de almas penadas. Poucas estações foram vistas com bons olhos pelas autoridades. Algumas, recuperadas e descaracterizadas transformaram-se em museus, bibliotecas... Residências. Outras, tangidas pela ignorância, o desprezo e a falta de coração, deixaram cair o teto, crescer o mato, abrigar formigas, cupins e fantasmas. 
    O destino das nossas antigas estações ferroviárias, é semelhante ao destino das também nossas lagoas interiores cansadas de uma luta inglória contra a tendência aniquiladora do bicho homem. Pesquisador sério nos estados nordestinos não anda somente com máquina fotográfica e caderno de anotações. Mas também com lenço quilométrico, igual ao do pescoço de Lampião, pois a qualquer momento pode se deparar com cenários exigentes de fontes lacrimais. 
       
     



PROCURA-SE UM OTÁRIO Clerisvaldo B. Chagas, 24 de novembro de 2016 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica 1.596 Ilustração ...

PROCURA-SE UM OTÁRIO

PROCURA-SE UM OTÁRIO
Clerisvaldo B. Chagas, 24 de novembro de 2016
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.596

Ilustração (dreamstime)
Da Escola Lions para cima, ninguém ousava caminhar a partir das vinte horas. Era a tal bandidagem marcando território e surpreendendo transeuntes no Bairro Floresta. Um padeiro, meu aluno na escola citada, quase sempre dormia durante as aulas. Sua faina que iniciava às cinco da manhã, não permitia chegar à escola noturna sem o cochilo reparador.  Com as aulas para adultos mães e pais de família, nunca deixei de reforçar o ânimo, as notas e os interesses dos mais abnegados. O padeiro, encerrada as aulas e o cochilo, teria que subir a colina do perigo em torno das vinte e duas horas. Santana do Ipanema, onde os marginais cobravam pedágio em suas zonas, não tinha muito sossego na periferia.
Ao terminar uma das aulas, o padeiro foi acuado a caminho de casa por dois bandidinhos que comentavam na moita: “Lá vem um otário”. Com o pulo de ambos diante do trabalhador gritando: “É um assalto!” O padeiro não se intimidou e fez alumiar uma peixeira nova de dez polegadas que acionou velocidade na fuga dos dois cabras.

xxx

Visitando em viagens de recreio várias cidades ribeirinhas, em Alagoas, jamais durante muitos e muitos anos vi uma placa informativa de perigo e nem tipo algum de salva-vidas.  Essa é a tradição no Velho Chico, cidades e povoados completamente esquecidos do poder público. Uma pobreza de fazer dó! Ninguém sabe quantos já morreram afogados naquelas águas, sendo a imprudência sempre apontada e conduzindo a culpa. Jamais tive conhecimento de que se acusasse alguém pela morte por afogamento do estudante, da criança, do turista... De um  qualquer.
Eis que de repente, um ator famoso em evidência, convida uma atriz colega, vão para um lugar deserto e perigoso do rio, a sós. Acontece à tragédia, morre o homem afogado. Sob pressão da empregadora, PROCURA-SE UM OTÁRIO que pode ser o prefeito da cidade, um canoeiro, um vigia ou outra vítima qualquer porque não podem acusar a Sereia e nem o Nego d’Água. Mas encontraram o OTÁRIO. Dilmas Roque, Secretário de Turismo foi acusado pela promotoria de Canindé de São Francisco pela morte do ator Domingos Montagner.  Isso é coisa para o riso de quase meia hora se não fosse uma coisa tão ridícula.  Que subserviência!... Por que  a promotoria não acusou a ela mesma, promotoria, por não haver placa indicativa de perigo no rio, antes da tragédia?
Finalmente encontraram não só o OTÁRIO, mas também um BOBO DA CORTE fora da realidade. É Brasil,  Mané.