OS JACUS DA ESCOLINHA Clerisvaldo B. Chagas, 24 de janeiro de 2022 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.647   Como tud...

 

OS JACUS DA ESCOLINHA

Clerisvaldo B. Chagas, 24 de janeiro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.647



 

Como tudo se coloca na Internet, o jacu está sempre aparecendo para quem quer pesquisar. Trata-se de uma ave do gênero cruciformes e com suas 15 espécies são encontradas na América Central e América do Sul. Gosta de áreas de florestas e seu nome jacu ou cujá significa comedor de grãos. O povo sempre complementa o nome das espécies de variadíssimas maneiras. O bairro de Maceió, por exemplo, chamado Farol, antigamente era chamado Alto do Jacutinga. Nunca me deparei com um jacu em carne e osso. Bicho geralmente preto do tamanho de um pavão, mas de cores variadas na plumagem, conforme a espécie.  Entretanto na escolinha onde fiz exame de Admissão ao Ginásio, a professora particular Helena Oliveira, parecia entender muito bem desse animal.

Tudo que eu sabia a respeito da ave era sobre uma caçada que as pessoas do alto sertão faziram e nada mais. Nem mesmo soube se a sua carne selvagem era saborosa ou não. Mas na escolinha quando o aluno apresentava à professora sua redação, tinha sempre uma resposta igual da falta de paciência: “Essa redação está mais parecendo com uma cagada de jacu”. Pessoalmente, nunca gostei da palavra “cagada” e sempre uso um termo mais civilizado. Mas na escolinha quem não tinha letra boa, ia para “jacutância”.

Falam que quando o Jacu se aproxima de uma residência rural, quer participar da ração de grão jogadas no terreiro para as galinhas e semelhantes. Se alguém não o espantar poderá ir ficando e ganhando terreno no criatório doméstico. Mas, quase todo animal selvagem faz isso desde que haja cumplicidade com o zelador. Sempre que eu me dirigia para o povoado Pedra d’Água dos Alexandres, passava no terreiro de uma casa que mantinha uma seriema cantadeira criada com outros animais da fazenda, aproximadamente no sítio Morcego. Ora, seriema é predadora de serpentes e não bem vista por maus presságios sobre a seca. E se ela pode, por que o Jacu não pode! Infelizmente esses animais maiores estão ficando cada vez mais raro encontra-los na Natureza. O bicho homem é um exterminador nato.

Você gostaria de criar um Jacu no seu apartamento?

JACU (FOTO DE AUTOR NÃO IDENTIFICADO).

  SANGUE AZUL Clerisvaldo B. Chagas, 21 de janeiro de 2021 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.646   Todos os domingos es...

 

SANGUE AZUL

Clerisvaldo B. Chagas, 21 de janeiro de 2021

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.646


 

Todos os domingos estávamos a chupar as mangas ”Gobom”, carnudas, caroços quase inexistentes, no sítio do senhor Olavo, na serra do Gugi ou almoçando no sítio Cedro do Gugi, no pé desta serra, na casa do eterno candidato a vereador Jonas. Isso tudo após um belo banho num poço aprazível do riacho Gravatá, afluente do rio Ipanema. Duas léguas do centro de Santana até ali, o equivalente a 12 quilômetros, vencidos rapidamente a pé. Aproveitávamos o prestígio da família Carvalho na serra do Gugi com José Carvalho e Mileno Carvalho e sítio Cedro do Gugi com a amizade entre o senhor Jonas e nosso amigo Francisco de Assis que sempre ia conosco. Após comermos a galinha de Jonas e dona Creusa, sua paciente esposa, subíamos à serra para o sítio da família Carvalho, casa de dona Neném e para o engenho de pau de Olavo para tomar caldo-de-cana a que eles chamavam de “garapa”.

Certo dia fomos convidados para um almoço às margens do Gravatá onde estava havendo uma festinha caseira, talvez de um batizado. Na hora da mesa muitas mãos nuas das cozinheiras retiravam macarrão para os pratos e aquilo me deu náuseas. Aleguei que não queria almoçar, estava de barriga cheia, mas fui contestado por uma solteirona da cidade, no meio de todos. “Esse povo é fidalgo, não come na casa de pobre, não”. Disfarcei a conversa daquela “doida”, mas fiquei morto de vergonha. Tive que esperar pelos amigos até que eles resolveram retornar a Santana. Aí sim, eu conheci na realidade o que povo falava: “duas léguas de fome”, até chegar em casa.

Não faz muito tempo assim, fomos convidados, eu e minha esposa, por uma exímia cozinheira, para uma buchada em sua residência. Fomos com a maior satisfação parar no Bairro Lajeiro Grande. Durante o almoço a cozinheira dizia: “Ah, minha gente, pessoas da vizinhança se ofereceram para almoçar buchada com vocês. Cortei tudo na hora dizendo que a buchada era para fidalgos, pessoas do sangue azul. Foram gargalhadas para todos os quadrantes da casa com àquela brincadeira.  Logo veio à lembrança do almoço do Gravatá. E dessa vez, a amizade verdadeira e sincera me deixou mesmo quase acreditando – de mentira – que nós éramos fidalgos e de sangue azul.

Sangue azul comendo buchada... Pode! Mas não era o sangue azul do Gravatá.

RIACHO SANTANENSE (FOTO: BIANCA CHAGAS).

 

  O CASAMENTO NA ROÇA Clerisvaldo B. Chagas, 20/21 de janeiro de 2022 Escritor Símbolo do Sertão Alagoano Crônica: 2.645   Zé Mula...

 

O CASAMENTO NA ROÇA

Clerisvaldo B. Chagas, 20/21 de janeiro de 2022

Escritor Símbolo do Sertão Alagoano

Crônica: 2.645




 

Zé Mulato não queria passar vergonha. Deveria seguir a tradição da zona rural. Não era rico, mas conhecido como barriga-cheia (pessoa equilibrada financeiramente).  E como não era todo dia que casava uma filha, sim, faria uma festa para ninguém botar defeito. Mandou abater o maior e mais gordo porco da fazenda; Galinhas, capãos, patos e guinés; um carneiro de 15 quilos e fez avaliação se precisaria matar um boi para assegurar a demanda. Um carro de boi chegou da “rua” repleto de bebidas e descarregado na ampla dispensa por trás da casa. Dona Creusa Mulato, sua esposa, trouxe as mais famosas cozinheiras dos arredores para o preparo dos quitutes.  Outras pessoas vieram para ajudar a abater os animais.  Da cidade, foram convidados o padre e suas comadres da Igreja.

A sobrinha de Dona Creuza, Tereza, que havia chegado recentemente de São Paulo, tomou à frente da parte do cartório, da Igreja, do vestido da noiva e de coisas semelhantes. Foi contratado um sanfoneiro que ainda se dizia parente de Luiz Gonzaga.  Enfim, dentro de um mês de corre-corre, estava tudo preparado para o grande dia. Inúmeros cavaleiros acompanhariam os noivos a cavalo e após o retorno da Igreja, teria início a festança em que Mulato calculara em três dias. Um cabra mal-encarado, sobrinho do pai da noiva, estava encarregado da segurança; esse nem bebia nem fumava, era só de olho duro em possíveis malfeitos.

A festança durou os três dias previstos por Zé Mulato. Forró dia e noite. Pela tradição, a noiva só poderia dormir com o noivo após a festa. O que coincidiria com os três dias previstos. Mas, devido o alto efeito da cachaça, não havia vigilância sobre eles. E acontece que após o cair da tarde, quando começavam a chegar as primeiras sombras da noite, ninguém via mais a noiva... Nem o noivo. Será que estavam rezando! Bucho tinindo de tanta comida e cabeça nos pares do forró, quem iria querer saber da noiva que não fosse a sua. E como tudo seus mistérios, até Zé Mulato e Creusa caíram no sapateado da sanfona. Os noivos estavam cansados de tanta espera.

A prima Tereza lembrou-se que ali pertinho havia um belíssimo arvoredo. Mas...Pensando bem...

Arvoredo não fala.