SOBREVIVENTES DA FOLIA
Clerisvaldo B.
Chagas, 10 de março de 2017
Escritor Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica 1.639
Ilustração (Cultura-Estadão). |
Repete-se o ciclo e finalmente março
de novo. Para uns, o mês das águas, para outros, o primeiro dia de real
trabalho no Brasil. Terceiro mês do ano no calendário gregoriano e um dos sete
meses com 31 dias. O nome março surgiu na Roma Antiga, quando era o primeiro
mês do ano e chamava-se Martius, de
Marte, o deus romano da guerra. Em Roma, onde o clima é mediterrânico, março é
o primeiro mês de primavera, bem como para que se comece a temporada de
campanhas militares.
Para a grande maioria do trabalhador
do Brasil, apenas um mês longo, sem feriado e início da dureza. A classe
política de Brasília nem está dormindo direito, aguardando ansiosos certas
rebordosas que irão despontar neste mês de guerra. No rio São Francisco, como
sempre, inúmeros afogamentos das nascentes à foz. Em Pão de Açúcar morrendo uma
policial do estado sergipano. No interior de Alagoas, acaba-se o tão falado Carnaval
de Piranhas que durou alguns anos polarizando a festa de Momo. É isso que dizem
os foliões santanenses que sempre se deslocaram para o rio. E Pão de Açúcar
como opção capricha na alta temperatura (terceira do Brasil) desestimulando
muitos aventureiros em direção a terra Espelho da Lua.
Com muita zuada e quase ninguém nas
vias, agoniza os velhos carnavais santanenses que parecem enjoados nesses
tempos modernos. No Sertão inteiro, os que não estão pulando sem graça,
dividem-se entre às próprias residências, chácaras, fazendas e sítios torrados
pela seca. Entram na cachaça à sombra do alpendre, dos juazeiros, das
algarobeiras.
Em Olho d’Água das Flores, é dia
tradicionalismo em contar os bêbados logo pela manhã em famoso beco da cidade.
Chega a tão odiada pelos bebões
quarta-feira de cinzas, mas abraçada pela fé católica como início da Quaresma;
período de quarenta dias em que se aproveita para uma faxina negativa e reconciliação
com o Grande Arquiteto do Universo. Isso faz lembrar o saudoso vereador
santanense Zé Bodinho: “Não bebo durante a Quaresma de modo nenhum”.
E nesse amanhecer de março, enquanto
uns estão ainda roncando jogados nas vielas, lambidos pelos cachorros e outros
contam os bêbados dos becos, a Igreja abre as portas para cruzar a testa dos
fiéis com cinzas bastante significativas. Afinal, tudo vira cinzas mesmo,
apreciadas pelos sobreviventes da folia.
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