CRÔNICA FEITA (Clerisvaldo B. Chagas. 7.7.2010) O amigo gosta de mudanças? Quero dizer, apartamento novo, entregue na obra. Você nem imagin...

CRÔNICA FEITA

CRÔNICA FEITA
(Clerisvaldo B. Chagas. 7.7.2010)
O amigo gosta de mudanças? Quero dizer, apartamento novo, entregue na obra. Você nem imagina o requifife que aparece! O bicho é como automóvel que se recebe pelado. Se há reclamação, tem sempre um sujeito maneiroso que procura justificar os erros; mistura de ambulante e rábula. É preciso fazer os armários, trocar a pia, rejuntar o esquecido. Aí você se lembra de ligar o gás encanado, solicitar serviço de telefonia, da Internet. As providências crescem, ficam do tamanho do serrote do Cruzeiro, um monte da minha terra. Ninguém aparece. De repente o sufoco danado. Chega tudo de uma vez. Ali, dois marceneiros batem, furam, serram. A zoada constante da furadeira estressa até os santos. Outra furadeira responde à primeira; é o homem trocando a pia. Bate, fura, serra; serra, fura, bate. Olhe, o sujeito do rejunte chegou. Puxa os móveis, inicia o trabalho. Toca a campainha. São dois gesseiros. Vão tapar os buracos que não servem para nada. O celular chama. No outro lado da linha, perguntam se o rapaz da TELEMAR chegou. Os gesseiros vem dizer que só faltam acabamento e pintura. Chamam à porta. É um fuleiro qualquer entregando propaganda de TV. Seis homens de uma vez mexendo no apartamento. Você nada pode fazer. Um precisa um pouco de cimento, outro quer uma broca de parede. O primeiro faz coisa errada, dá duro para consertar. Ao se virar para a conferência, o homem do rejunte vem dizer que terminou o serviço faz um cumprimento e vai embora. Ainda bem. Agora ficam somente cinco. Os gesseiros também vão embora. Você calibra a paciência para três. As furadeiras, entretanto, valem por mil. A parada para o almoço é um ufa bem suspirado, uma sentada providencial, um choro que não vem. Fica apenas o chato telefone pegando carga: bip, bip, bip... Ah, Maceió!
Em mais alguns dias seguidos, recomeçam as ladainhas. O indivíduo da ALGÁS demora a um chamado. Novos telefonemas, apertos do patrão e, o camarada no instante chega desconfiado. Lá vem novo lamento. O eletricista quebra o suporte da luminária e quando você põe a mão à cabeça, chega um curioso querendo espiar tudo. Mas é cada uma! E o telefone, meu amigo! Telefone só com o “habite-se” da prefeitura. Enquanto o “habite-se” não sai, nem telefone nem Internet. Olhe a novidade, gente! Maior velocidade na Internet, o dobro da que tem agora. Mas como, criatura!? (Diria o Carlos Sampaio do SINTEAL). Cadê a autorização da prefeitura? Paciência, Seu Mané. Aqui é diferente. Às vezes querem fazer Roma num dia só. Ô diabo! Que maçada o marceneiro dá. Atende mil pessoas de uma vez só e reduz as horas que trabalha no seu serviço. Não senhor, puxar os cabelos não adianta, Zé. Não sei. Pois bem, quem não tiver paciência não conte os passos da preguiça. E como já foi dito e exemplificado, faça a experiência. Foi diante de tanto ruge-ruge que o amigo aconselhou e riu: você não é cronista? Faça uma crônica. Onde se vai arranjar tempo, não sei, mas está aí a CRÔNICA FEITA.



O BAR DA CÍCERA (Clerisvaldo B. Chagas. 6.7.2010) Em nossas brincadeiras em Santana do Ipanema, tínhamos os nossos lugares prediletos. O b...

O BAR DA CÍCERA

O BAR DA CÍCERA
(Clerisvaldo B. Chagas. 6.7.2010)

Em nossas brincadeiras em Santana do Ipanema, tínhamos os nossos lugares prediletos. O bar do Erasmo, no início da Rua São Pedro, era um deles. Os frequentadores dividiam-se entre profissionais autônimos e funcionários do governo. Cerveja sempre gelada, mas o tira-gosto vinha das casas de alguns desses frequentadores que moravam próximos. O Erasmo colocava bastante pimenta e poucos provavam dos pratos que chegavam. Lembro de pessoas interessantes que buscavam aquele bar como os professores Marques (Filosofia), Eli (Matemática) e José Maria (História). Entretanto, o nosso refúgio predileto era o bar do Biu, à Rua Delmiro Gouveia. Depois o Benedito Pacífico ampliou o estabelecimento, mudando de categoria com o sugestivo título: “Biu’s Bar e Restaurante”. Ali frequentamos por mais de vinte anos porque o Biu atendia com gentileza, era um local aconchegante e tranquilo. Nas paredes havia quadros com paisagens de países estrangeiros, principalmente os de quatro estações. Ao fundo, o belíssimo quadro panorâmico natural do rio Ipanema. Durante as cheias, águas por cima das pedras do poço das Mulheres. Na estiagem, o bucólico cenário típico nordestino. Areia, pedras e mato. Um jumento pastando, uma vaca amarrada, um menino caçando passarinho. Nada pagava o cenário tristonho do rio. Foi dali do Biu’s Bar e Restaurante que partiu a primeira excursão a pé até a foz do Ipanema. Com a falta do Benedito, o seu filho Jairo assumiu definitivamente o negócio que hoje funciona como bar e salão de festa, muito solicitado, por sinal.
Certo dia, porém, eu e o Zé Maria, resolvemos girar por outros lugares de Santana e fomos parar na Rua São Pedro. O ponto escolhido foi a bodega da Cícera que também funcionava como bar. Pois bem, quando chegamos por ali, ouvimos logo a música “Feiticeira” que estava fazendo sucesso. Pedimos cerveja, puxamos conversa vendo a satisfação da dona com a nossa presença. O amigo Zé Maria foi logo dizendo que a música era muito bonita. Com isso, a Cícera encheu-se de satisfação e esqueceu o CD que rodou até ninguém não mais aguentar. Pagamos a conta e fomos embora com a cabeça cheia de cerveja e os ouvidos zoando com a “Feiticeira”. Em outros lugares comentamos que o bar da Cícera só tocava aquela música, por isso não iríamos mais ali. Ora, ninguém pode dizer daquela bebida não beberei. Uns quinze ou vinte depois retornamos, sem sentir, à mesma bodega. A Cícera aproveitou à hora, colocou os cotovelos no balcão, segurou o queixo e indagou contundente: ”Zé Maria, me diga uma coisa. É verdade que você e Clerisvaldo andaram dizendo por aí que meu bar só tocava “Feiticeira”? Confesso que na hora não encontrei saída. Mas o professor Zé Maria Amorim, improvisou bonito igual ao Nêgo Zé Lima. Disse bem sério diante do rosto interrogador: “É verdade, Cícera, a gente comentou mesmo, mas se você não colocar agora a música “Feiticeira”, a gente vai embora nesse momento e nunca mais vem aqui”. A mulher abriu-se num sorriso largo, e haja cerveja com tira-gosto de “Feiticeira” até umas horas. Depois dessa, cabra velho, não me lembro de ter posto os pés novamente no BAR DA CÍCERA.

GORILA DO PARQUE (Clerisvaldo B. Chagas. 5.7.2010) Os bons tempos das festas de Senhora Santa Ana já se foram. Durante o novenário do mês ...

GORILA DO PARQUE

GORILA DO PARQUE
(Clerisvaldo B. Chagas. 5.7.2010)

Os bons tempos das festas de Senhora Santa Ana já se foram. Durante o novenário do mês de julho, a multidão tomava conta da Praça Emília Maia à Rua Tertuliano Nepomuceno; da Rua Nilo Peçanha à Ponte Padre Bulhões. Primeiro vieram às inúmeras barracas com as mais diferentes atividades, principalmente, as relativas a jogos e bazares; tudo, da Igreja Matriz ao Mercado de Carne. As bancas de comidas, à base de galinha de capoeira, puxavam mais para a Rua Tertuliano Nepomuceno. Ali havia forró em vários lugares. Não podiam faltar nem a onda nem o curre por trás do “sobrado do meio da rua”. Na hora aprazada, ajeitava-se o balão enorme por trás das casas comerciais Arquimedes Autopeças e A Triunfante, de Manoel Constantino. Descia a banda de música do maestro Miguel Bulhões para abrilhantar o novenário. Após as solenidades religiosas, íamos ver o barco de fogo correr bonito no arame suspenso, defronte a igreja. Tempos à frente, veio à segunda fase. A fase do parque de diversões que empurrou a onda e o curre para cidades menores e povoados. O parque trouxe novidades como barcos, roda-gigante, pescaria a seco, tiro ao alvo, bingo e serviços musicais. Rapazes e moças gostavam de mandar músicas através do parque. Ao rapaz da blusa azul ou à moça do vestido vermelho, a música seguia com a frase: “Você já sabe”. E entrava Waldik Soriano, Silvinho, Miltinho e outros famosos da época, machucando os apaixonados.
Certo dia chegou à festa de Senhora Santa Ana, algo diferente. Armada na cabeça da Praça Senador Enéas Araújo, uma barraca bem feita com desenhos grandes nas tábuas, anunciava a mulher barbada e o homem que vira gorila. A barraca lotava na força da propaganda. Lá dentro, com os truques através de espelhos, mágicas e Física, a gostosona virava mulher barbada e, o homem forte transformava-se em gorila. Enquanto homem, o sujeito era manso; ao virar gorila, ficava brabo e queria engolir o mundo. Era um pandemônio desgraçado!
As eleições vem aí. Só se houve salvadores do Brasil. Como disco enganchado: “Porque a Saúde, porque a Educação... Porque a Saúde, porque a Educação... Porque a Saúde, porque a Educação... Eles se pronunciam. Todos são velhos conhecidos da gente. Depois os libertadores encerram o assunto, nem Saúde nem Educação. Sequer uma palavrinha com o homem comum, o homem do povo. Eles desaparecem do cenário como por encanto. Tornam-se escravocratas, reizinhos arrogantes e sujeitos imortais. Adoram serem endeusados pelos espíritos fracos dos puxas, dos borras, dos capachos... dos gansos. Pouquíssimos, raros mesmo, são os que não se deixam contaminar com a metamorfose. De maneira geral elas transformam-se em mulheres barbadas. E os masculinos (que transportam há muito o espírito de porco), com sadismo até, viram gorilas, muito parecidos com o GORILA DO PARQUE.