A
COBRANÇA
Clerisvaldo B. Chagas, 19 de novembro de 2024
Escritor
Símbolo do Sertão Alagoano
Crônica: 3. 148
Não era ônibus moderno, nem o trem, nem vans,
era o caminhão bruto quem levava e trazia passageiros e mercadorias. Os
mascates de Santana do Ipanema que davam feira em Olho d’Água das Flores,
Carneiros, Pão de Açúcar, submetiam-se a esse único tipo de transporte. Assim,
os caminhões partiam para as cidades circunvizinhas lotados de mercadorias para
vender naquelas feiras. Os donos da mercadoria, isto é, os mascates, viajavam
em cima da mercadoria, sentados em duas alas, pernas penduradas para fora da
carroceria. A dureza da profissão fazia surgir tipos engraçados que também iam
para feira levando tipos de jogos como negócios. Piadas gargalhadas, histórias
curtas e divertidas, procuravam amenizar a tensão nascente do dia.
Quando o destino era Olho d’Água das Flores,
por exemplo, a jornada pela rodagem empoeirada, tinha estacionamento na divisa
dos dois municípios onde havia uma casa de fundos voltados para rodagem e um
grande pé de jasmim no terreiro. Ali, o proprietário do caminhão, o próprio
motorista, fazia a cobrança subindo à carroceria e se equilibrando por cima de
lona dobrada, caixas de tecidos, louças e tantos outros objetos. Registramos
proprietários caminhoneiros como o senhor José Cirilo e Plínio, irmão de
Eduardo Prazeres, dono de olaria. Clientela costumeira, sem problema algum,
pagamento certinho, cobrança em lugar estratégico e jornada de volta. Em tempos de inverno, às vezes, no retorno da
feira, se pegava o valente riacho João Gomes com cheia violenta e ainda sem
ponte. Pense
na trabalheira infernal que entrava pela noite!
Essa gente representava os verdadeiros heróis
do progresso que abasteciam cidades e municípios de tudo o que eles precisavam
para
garantir azeitado o cotidiano. Tempo duro para quem era mole onde o futuro era
ali mesmo na hora presente. Ah... E quando o rio Ipanema, também sem ponte,
assustava os mascates com suas cheias descomunais! Entretanto, desafios sempre
estiveram presentes no caminho da humanidade. Sem desafio tudo vira rotina e
monotonia esfriando o caminheiro do planeta Terra. Mas, voltando aos heroicos
tempos dos mascates, nunca conseguimos apagar da mente a parada da cobrança, na
casa virada do pé de jasmim.
Assim é o caminhar da gente quando, de vez em
quando, a vida pára e nos faz a cobrança.
REPRESENTAÇÃO SANTANA
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