LAMPIÃO
EM SANTANA DO IPANEMA
Clerisvaldo B. Chagas, 10 de dezembro de 2014
Crônica Nº 1.321
(...)
“Nessa altura, ouviu-se um toque de corneta no quartel de polícia, na quadra,
ainda instalada na Cadeia Velha, localizada na Rua do Sebo. O tenente, com suas
14 praças, até que enfim, resolvia sair das encolhas. Menos mal. Quase sem
interrupção, na sede do Tiro, também ecoava o mesmo toque de reunir. O brigada,
em uniforme de campanha, marchou ao lado dos seus gatos-pingados para as
barricadas formadas com fardos de algodão em rama, na entrada da Rua da Poeira.
Os demais pontos vulneráveis da urbe contavam igualmente com destacamentos
armados para enfrentar a onda. Na verdade, nunca me passou pela cabeça que
naquele burgo tranquilo, houvesse tanto bacamarte
e tanta munição amofambados. Seria, com efeito, uma vergonha permitir a entrada
de Lampião ali sem desfechar um tiro. Os sete serrotes que circundam Santana do
Ipanema, no desenrolar daquela tarde e indizível inquietação, pareciam outras
tantas sentinelas mudas e gigantescas como a aguardar a nossa atitude viril
diante do perigo que parecia inarredável. Mas como o momento do confronto
tardasse, alguns chefes de família recursados, valendo-se de dois automóveis
disponíveis, resolveram retirar parte de sua gente para Palmeira dos Índios e
Quebrangulo., ao passo que outros preferiram para tanto se voltar confiantes
para a faixa da caatinga mais próxima. Orientação desastrada que só serviu para
empurrar mais facilmente alguns deles para a boca do lobo. Foi uma noite
inteira de inquietadora expectativa aquela que passamos nas barricadas da Rua
da Poeira. Ninguém deu um cochilo e nem era concebível. Sem embargo, porém, de
estarmos no inverno, a barra se mostrou de súbito, as nuvens se dissiparam e ironicamente,
mais um dia de primavera se mostrou em todo o seu esplendor. Fazia frio. Alguns
de nós, sentiam fome e pediram licença ao brigada Ribeiro para ir à padaria de
Jorge Firmo de Melo, que ficava juntinho, a fim de se sortirem de massas. Entretanto
o espetro Lampião e seu bando sinistro dominava todas as cogitações. Por andava
o ex-comungado do salteador, por enquanto ninguém sabia”.
(LIMA
Valdemar de Souza. O cangaceiro Lampião e o IV mandamento”. Maceió, Sergasa,
s.d. pp. 36:37).
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