O CASO DA MANTEIGA
(Clerisvaldo B. Chagas, 17 de setembro de 2010)
Você já ouviu falar até demais que “o pão do pobre somente cai levando a manteiga para baixo” (pelo menos quando tem manteiga). Para confirmar, também existe a expressão chula, aquela que diz que se fezes tivesse valor o pobre nasceria sem a parte polêmica do aparelho digestivo. Quando o agrônomo doutor Otávio Cabral, veio para Santana do Ipanema, pelo governo da época, aqui fez uma verdadeira revolução na agricultura. Para fomentar o algodão no Sertão alagoano, trouxe o arado, uma coisa desconhecida para todos e, a vontade de fazer progredir a lavoura diante de seus conhecimentos adquiridos em terras distantes. As novas técnicas agrícolas foram mostradas e aprendidas bem como as discutíveis cercas de arame farpado. Nas décadas de 1950-60, virou moda no sertão o plantio do avelós, também chamado labirinto. Planta da família das euforbiáceas (Eufhorbia tirucalli), originária da África. Antes as terras não tinham cercas. Os marcos entre as diversas propriedades rurais quase sempre eram os acidentes geográficos como rios, riachos, serras e serrotes. Alguns fazendeiros, porém, usavam mestres escravos peritos em cercas de pedras, obras de arte que ainda hoje causam admiração. (TCC do Curso de Especialização do autor: Negros em Santana). Com o sistema generalizado de estacas de madeira e arame, implantado pelo doutor Otávio, ficaram as propriedades cercadas, mas transparentes. Quando chegou o avelós, os fazendeiros iniciaram esse plantio nos pés das cercas e em toda a extensão das fazendas resguardando-as dos olhos de quem passava nas estradas. Criou-se aí outra especialidade ingrata que foi a de aparador de labirinto. O cidadão trabalhava com máscara e óculos, pois o avelós produz uma substância leitosa e farta que provoca a cegueira. Os mestres eram poucos por causa dos perigos apresentados, numa época em que prevenção e direitos trabalhistas ainda eram coisas raríssimas nos sertões nordestinos. Ainda existe uma família na região de Santana conhecida pelo apelido de “Labirinto”, graças ao cidadão que ficou conhecido como “Sebastião Labirinto”, falecido há pouco tempo no Bairro São José.
A partir, aproximadamente dos anos 80, os próprios fazendeiros foram erradicando a Eufhorbia tirucalli, voltando às cercas ao normal, deixando que o viajante pudesse contemplar, toda paisagem das cercanias. E agora, nesse início de século, vão surgindo notícias sobre pesquisas com o avelós e seus encaminhamentos para a indústria. E o diabo da planta que só prestava para cegar as fazendas e os homens, vai virando matéria-prima para cola e outros produtos de alto valor no mercado. Hum! Os bovinos gostavam do seu abrigo durante inverno e verão, mas os casais clandestinos tinham muito que contar. Durante o inverno a parte de baixo do avelós era sempre enxuta e quente. Dava para arriscar um olho! E esse danado que nada valia que fez o pobre arrancá-lo com raiz e tudo, começa a ser procurado e irá valer bastante dinheiro. Será que você ainda não acredita no ditado chulo do povo? É o mesmo CASO DA MANTEIGA.
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