‘SEMANA E CASO DO PADRE
CÍCERO
Clerisvaldo B. Chagas, 27 de julho de
2020
Escritor Símbolo do
Sertão Alagoano
Crônica: 2.353
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Contando
caso acontecido nos sertões nordestinos.
Seu Guilherme, baixinho, branco e de idade
avançada, não perdia um ano sem ir a Juazeiro do Norte, a pé. Morava no Bairro
Lajeiro Grande e zelava a igrejinha do padre Cícero no lombo do lajeiro.
Aqueles que tinham a coragem do senhor Guilherme, enfrentavam em torno de 500
km por todos os tipos de estradas, sol, chuva, animais selvagens, sede e
cansaço nessa estirada de pedras e areias.
Quem já caçou no sertão, lembra da espingarda
“soca-tempero”. Assim chamada porque
carregava pela boca. A pólvora, o chumbo, a bucha de corda velha eram socados
pela vareta – acessório metálico da arma. Após, levantava-se o cão e colocava-se
a espoleta. Estava pronta para o tiro. O chumbo grosso ou fino dependia do
porte da caça. A pólvora era guardada pelo caçador em uma cabacinha natural, fruto
do cabaceiro. Muitos envernizavam caprichosamente esse depósito que era tampado
com pedacinhos de madeira ou sabugo. O chumbo era armazenado em um saquinho de
tecido especial com saída arredondada e metálica, chamado chumbeiro. Motivo de
apelido para pessoas de boca pequena e redonda: boca de chumbeiro. Em Santana
do Ipanema, comprávamos pólvora em embalagem cilíndrica no armazém do senhor
Marinho Rodrigues, no “prédio do meio da rua” ou na mercearia do senhor Manoel
Vieira, no beco do Mercado de Carne onde hoje é o supermercado Todo Dia. Chumbo
também.
Um grupo de romeiros se dirigia a Juazeiro, a
pé. Parou numa casa pediu rancho (pousada). Durante a madrugada, um deles viu atrás da
porta uma cabacinha de pólvora, pendurada. Era tão formosa que ele não resistiu
e carregou o objeto. No outro dia, o grupo prosseguiu viagem. Uma vez em
Juazeiro, providenciaram as coisas de praxe e na volta foram pedir conselhos e
bênção ao padre Cícero. Este aconselhou ao grupo, mas, na saída, chamou um dos
componentes e disse: “Amiguinho, quando vocês voltarem e dormirem na casa do
senhor Fulano de Tal, deixe a cabacinha no mesmo canto em que você pegou”. Fato
narrado no livro que mudou a minha vida: “O Patriarca do Juazeiro”.
Na cidade de Ouro Branco, sempre é formado um
grupo de romeiros que continua a tradição. Não temos mais essa força, porém,
conhecemos pessoas em Santana do Ipanema que há pouco enfrentaram esse desafio.
Os motivos da caminhada são diversos, mas sempre tendo como pano de fundo algo
difícil de conquistar ou já conquistado pela fé através do milagreiro cearense.
Seu Guilherme, se fosse vivo, ficaria bastante
desgostoso em saber que no Lajeiro Grande substituíram sem coração o santo
popular do credo sertanejo.
Cícero é obra de Deus e será sempre um vencedor.
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