OSÉAS E O BRASIL
(Clerisvaldo B. Chagas. 2.7.2010)
Passa do meio-dia na saída Maceió - Sertão. Vans estacionadas aguardam passageiros retardatários entre nojentas barracas enfileiradas e a imundície perpétua da localidade. Usuários reclamam do ponto perigoso de espera. Transitam à vontade os vendedores de drogas da favela às margens do asfalto. Passa o farrapo de uma garota de onze anos apontada pelos experientes que dizem ser viciada. Outras garotas mais velhas surgem perambulando entre as vans e as calçadas pretas. Vão chegando rapazes magros trazendo os sinais do vício; alguns com aspectos deploráveis, vítimas dos malditos efeitos do craque. A princípio, diz um proprietário de besta, que eles – os drogados – não mexem com seus passageiros. Não se vê ninguém, acintosamente, armado. Será esse o segredo da favela? Movimento normal de pedestres e automóveis. Na entrada do beco aparece nova personagem. Rapaz entre dezoito e vinte e um anos, simpático, bigodinho, bem trajado no comum. É muito calmo o rapaz. Escora-se à grade baixa da igreja evangélica e logo vai recebendo o apurado, dos seus súditos. Abrindo a mão, fechando e embolsando sem contar, sequer olha para os lados. Parece antigo na rotina de arrecadação. Ninguém pronuncia palavras. Somente gestos automáticos no dar e receber. Veículos encostam sem desligar o motor. Os zumbis de fora vão estirando a mão para os candidatos de dentro. Os carros deslizam calmamente na partida. A cem metros dali, fica a sede da Polícia Rodoviária Federal.
Em Santana do Ipanema, na penúltima casa da Avenida Coronel Lucena, Seu Oséas vendia puxa. (Puxa era um cordão de massa doce envolvido em papel manteiga). Os adolescentes que estudavam ali perto, no Ginásio, apreciavam a puxa vendida na bodega de Oséas. Homem de coração bom, alto, com uma pequena marca no rosto, Seu Oséas não tinha estrela para negociar. Segundo Marco Davi, ex-prefeito, morador quase vizinho da bodega, o sogro do comerciante, chamado Artur, ajudava o genro a se levantar. Aposentado do Fisco, o velho Artur chegara até a tomar conta da bodega para ensinar como se negociava. Tudo em vão. O genro não aprendia. Cansado de tanta coisa, Seu Artur desabafou com os conhecidos: “Vocês querem saber! Duas coisas nessa vida não vão para frente nunca; o Brasil e o meu genro Oséas!”.
Voltando ao caso das drogas, contra seu uso trágico e males gerais, vai se formando, sem dúvida, uma rede de assistência a saúde do usuário. Aos combates a traficante em fronteiras e em outros lugares; às advertências gerais sobre os perigos das drogas, misturam-se também à corrupção policial e à proteção de influentes figuras das mais diferentes profissões. O que fazer agora para não contaminar o restante dos jovens do País? Até quando vão proliferar as multidões de zumbis, como os da favela de Maceió? Dizem que tudo que o governo quer fazer faz. Mas é muito penoso acreditar que os problemas das drogas sejam resolvidos. Mesmo com todo otimismo sobre o caso, parece que essas questões fazem parte das palavras desesperadoras do aposentado do Fisco. O problema das drogas está difícil. Se a coisa fosse analisada pelo velho Artur, apesar das puxas doces, ele teria dito com toda certeza: “Três coisas nessa vida não vão para frente nunca! Solução para o craque, OSÉAS E O BRASIL”.
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