CALANGO MATOU UM BOI
Clerisvaldo B. Chagas, 6 de novembro de 2012.
Crônica Nº 9001
Lá ia eu pelos aceiros da
fazenda, puxando fio de ouro, tirando melãozinho das cercas, fazendo flautas de
talos de abóboras. Lá ia eu caçando rolinhas, sentindo o cheiro do gado,
descascando laranjas com as unhas. Lá ia eu vendo flutuando o brilhante
algodão, caminhando pela poeira das estradas, camisa aberta ao peito, ritmando
com os indicadores no peito:
“Calango
matou um boi
Retaiou
botou na teia
Lagartixa
foi bulir
Calango
largou-lhe a peia
Lagartixa
foi dar parte
Calango
foi pra cadeia...”
O pensamento fugaz desaparece, mas não
pretende fugir do Sertão, mesmo no meio desse trânsito maluco da capital, do
ruge-ruge urbano que não consegue esconder o romper de lembranças rurais.
E como apreciadores do inusitado, do incomum,
vamos também registrando cenas de fotógrafos de artes. Pena ter deixado a máquina
numa gaveta qualquer, pois o homem de barba longa está esperando alguma coisa
na esquina. Ali, bem pertinho, sob um antigo poste de ferro de lampião de gás,
o lixo amontoado estar sendo movido por um velho anão que jamais para o seu serviço.
Usa um pau curto e, seu bigode parece rir do que faz. Adiante, somente a cabeça
do moreno por trás do carrinho de mão, fazendo suas necessidades em plena
avenida. Ao lado, no automóvel, uma madama se ajeita no espelho do carro como
se não houvesse ninguém em seu redor. Um motorista grita a palavra “barbeira”,
colocando a cabeça para fora do veículo. A mulher ofendida se volta e espeta o
dedo maior de todos em direção ao gritador. Volto a pensar no sertãozinho de
todos os dias, no sol quente de rachar do interior. Maceió diz arreda, que
ninguém aguenta. Fico preocupado em escrever a crônica do dia seis e de repente
desperto nos seus braços. Sei não camarada, deixe-me viver mais um pouco entre
o sonho e a realidade. Droga!
“Calango
matou um boi
Retaiou
botou na teia
Lagartixa
foi bulir
Calango
largou-lhe a peia...
Ah! Pise fundo motorista, CALANGO ACABA DE
MATAR UM BOI...
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